sexta-feira, 8 de janeiro de 2021

Quatro degraus




 Oh santa ignorância! Mãe dos parcos saberes. 

Não seria melhor não saber que não sabemos de nada? No entanto, a negação da negação não gera nada. Nenhuma fórmula matemática.

Com um pouco de esforço, vemos uma escada de apenas quatro degraus. Aparentemente fácil de subir. Mas, como é árdua a escalada do conhecimento!

 No primeiro degrau encontra-se a desconhecida sabedoria, ainda dormente. Onde a vida é apenas um instinto. Somos viscerais demais para olharmos adiante. Vivemos num círculo de sede, fome e fornicação. Onde a morte é desconhecida e o futuro destemido. Não por bravura, mas , simplesmente ignorância.

Aqueles que olham para o segundo degrau, já encontram-se em outro patamar. O simples fato de ter consciência, gera a faísca do despertar que transmuta. Tornam-se dolorosamente conscientes da sua ignorância. E choram!

Com muito esforço, depois de muita evolução encontram-se no terceiro degrau. Onde jazem os doutores, os juízes, os ditos intelectuais possuidores do saber, e só! Olham apenas para baixo, pensam ter chegado ao pico, pois o último degrau está além dos sentidos. Envolto numa eterna bruma.

A todo instante nos vigiamos, com um peso enorme nos ombros, com a culpa do pecado capital e da expulsão do Éden. Afinal, não somos mais apenas um animal! Somos seres superiores, que se bradam Sapiens. E o que somos então? Deuses astronautas? Profetas do Apocalipse? Sacerdotes? Pastores? Monges? Animais conscientes? Ubermensch? Nada! Meros seres que sabem guerrear, orar, pintar, sonhar e amar.

Só atingiremos o último patamar, quando voltarmos a ser inconscientes, mas agora, seremos competentes. Como uma criança que faz a coisa certa sem precisar de castigo. Um budista que atingiu o nirvana. Um ser que transcendeu a culpa, o pecado e a maldade sem preocupação. Alguém além do juízo final. Alguém que ainda não nasceu. 


Isaac Furtado 


Bibliografia:


  1. Teaching for learning. Martin M. Broadwell. 1969.

  2. A genealogia da moral. Friedrich Nietzsche. 1887.

quinta-feira, 7 de janeiro de 2021

A concha e a onda

 


A concha falou para onda:

  • Leve-me para qualquer lugar. Confio em ti, nas suaves espumas das tuas franjas irei viajar.

E a onda disse:

  • Faço apenas o que o vento me pede. Às vezes, ele sussurra os destinos. Outras, na forma de tempestade grita forte, e eu o obedeço sem pestanejar. 

A concha:

  • Nas areias da praia irei descansar. Até que algum dia, uma grande onda me leve de volta para o fundo do mar. Novamente, de algum molusco serei um lar.

E assim o dia passou. Passaram-se meses, anos de conversa à beira-mar. A concha rolando pra lá e pra cá, sob a espuma da onda que rapidamente se desfazia. Maré baixa, maré alta, indo e vindo na praia, com a areia lhe polindo, lhe fazendo companhia.


Isaac Furtado